15 de julho de 2014

Mais uma história de amor não compreendido

Em meio a tanta gente ela ainda conseguia se sentir só. Forjava sorrisos e dizia em simpáticos cumprimentos que estava bem. Os olhos mentiam hipocritamente com um brilho sutilmente feliz. De repente seu olhar encontrou um sorriso. Aqueles dentes bem alinhados e aquela boca que ela conhecia bem. Ele estava lá como já era de se esperar, mas para ela encontrá lo sempre lhe causava surpresa. Notou que o cabelo dele estava penteado para o lado que ele não costumava deixar. Ele andou até ela e cumprimentou a. Ela sorriu sem esforço e sentou à mesa dele. As tias do quase nascido Arthur entraram no salão vestidas de criança, apresentaram um teatrinho simulando a infância do pai do Arthur, o Marcelo.
- Engraçado ne?
- Exatamente igual à nossa infância mesmo, minhas irmãs são ótimas.
- E seu irmão está muito ansioso para a chegada do Arthur?
- Provavelmente sim porque eu que sou tio estou muito. 
- Você será um bom pai com certeza.
- E como você sabe disso?
- Você adora crianças... minha intuição também diz.
- E ela diz com quem vou me casar?
Aline gelou, ela gostaria muito de dizer a ele que se dependesse dela os dois se casariam.
- Olha Aline, minhas irmãs estão fazendo aquele dia em que você fez xixi no Marcelo e ele te soltou.
- Nossa que vergonha.
- Pare de ser boba, você era apenas um bebê. Meu irmão nunca teve jeito com criança, está super ansioso e preocupado com a chegada do Arthur.
- Mas pelo menos ele teve a iniciativa de entrar para um curso de pais. Você entraria para um curso de pais Mário?
- Acho que não precisaria.
As homenagens ao casal Marcelo e Flávia acabaram e agora os convidados estavam a vontade para conversar e comer os quitutes do chá de berço.
Aline se divertia conversando com Mário. Eles falavam da infância e percebendo se que o destino os quisera tão pertos desde o nascimento. A mãe de Aline era prima do pai de Mário e a mãe dele era melhor amiga do colegial da mãe de Aline.
Um amor simples, uma amizade espontânea sem fingimos, mas o medo. O medo dos dois de estragar tudo. O medo de se arriscar. Nem todo mundo tem a sorte de amar o melhor amigo de infância. Aquela pessoinha que você beliscava por ciúmes do seu pai por brincar com ele. Aline é filha única e Mário tem 3 irmãs e 1 irmão. Mas até a adolescência eles ainda não sabiam que estavam destinados a pertencer um ao outro. Quem não quer um amor assim? Caro leitor, se você tem um amor assim, puro, de infância, repare bem. Arrisque se! Sua história pode ser linda ou traumatizante. Mas posso te dizer que das duas formas ela sempre dará uma nova crônica. A vida é para ser lida. Quem te lê pode ser um amigo, um pai, uma mãe, um irmão, o mundo inteiro.
Sonhei com um amor infantil, com essa pureza de encontrar alento ao segurar as mãos de alguém. Não sou mais criança mas posso voltar a ser para encontrar sorriso no caos. E é assim que tem que ser. Aline e Mário precisam voltar a ser criança para arriscar se a uma cicatriz ou a ganhar o mundo no olhar um do outro. O amor é assim, nasce como uma criança. Por mais planejado que seja nunca se sabe o dia exato em que ele começou a existir. O amor é um bebê que precisa de atenção, de cuidados, de carinho, de afeto, de proteção, de dois pares de mãos para abriga lo. O amor é um bebê que nunca envelhece.
4 de julho de 2014

As (entre)linhas e a ausência delas

Ando em constante luta entre razão e seja lá o que for o resto que faz doer órgãos que nunca imaginei que saudáveis poderiam ressignificar a dor. Falta ar mesmo com os pulmões cheios, dói o coração, o estômago parece estar cheio de intrusas borboletas lutando para subirem pelo esôfago e saírem pela boca. O coração ininterrupto segue após uma "parada cardíaca cerebral", batendo na caixa torácica e querendo sair pela boca carregado pelas borboletas. O por que disso tudo?  Porque simplesmente eu deixei as entrelinhas falarem por mim. Ou a ausência delas falarem por si. A boca seca a fala sessa e as linhas enchem se de frases sem contexto. E foi mesmo fora de contexto que o sentimento surgiu. Não havia motivos para estar ali. Foi numa manhã de quinta-feira feira quando eu o vi na padaria e ele me perguntou se eu gostava de pão de queijo. Eu disse que sim e ele disse que minhas bochechas eram fofas como dois pães de queijo.  Uma piada infeliz que me deixou desconcertada porque eu achei que meu amigo de infância estava curtindo comigo enquanto já tínhamos conversado sobre piadinhas. Mas relevei  porque parte de mim achou fofo ter uma cara de pão de queijo. Eu poderia ter escolhido achar a piada dele ofensiva mas deixei a observação de lado. Mas não foi ali que o sentimento surgiu? Nunca se sabe. 
A paixão não tem data ou hora marcada, ela entra sem convite e quando percebemos ela está ali num cantinho do peito fazendo morada há muito tempo. Mas foi numa tarde de terça-feira que talvez ela tenha pedido um espacinho dentro do meu peito.  Naquela tarde ensolarada em que ele me chamou para andar de bicicleta no calçadão e eu aceitei com um sim cabisbaixo que pareceu mau gosto. Aquela tarde em que dar um passeio para desestressar foi apenas uma desculpa para me tocar com suas mãos calorosas. Mas foi ali naquele olhar caloroso e aflito que o sentimento nasceu? Foi naquela amizade inocentemente infantil? Mas a infância não é de todo inocente. Lembro me que nós éramos namoradinhos no primário. Dávamos as mãos como outrora recente e parecia que nunca teria fim. Seria ali onde a sementinha do sentimento nasceu? Nada podemos afirmar, porque paixão é vida dentro da gente.  Uma vida viva e independente. E aquele olhar caloroso que se transformou em um beijo apaixonado, que tocou uma parte de mim que eu não sabia que existia, a parte que a mim não pertence. A parte que hoje a mim incomoda. 
Eu com os olhos arregalados e o coração a bater a mil por segundo perguntei lhe aflita o que era aquilo. Ele com o mais ingênuo sorriso disse com sarcasmo como ainda quase o ouço "ora, isso se chama beijo. Você gostou?",  bati com uma força banal no ombro dele dizendo "explique me o que foi isso ou..."   e ele interrompendo me "se você não gostou pode me devolver meu beijo". Naquele momento eu entendi ou quase compreendi quando eu o perguntava como as garotas caiam no papo dele. De cabeça baixa relembrei de quando ele chorou deitado com a cabeça nas minhas pernas pela garota que ele tanto dizia amar mas que o traiu com o primo dele. Não era a paixão pela ex namorada ainda recente? E ele a me cutucar dizendo "quando é que vamos te desencalhar". Um fluxo de memórias me fez perder a noção do espaço ao meu redor. Ele acariciou meu rosto dizendo "perdoe me, acho que eu não deveria ter te beijado". Em lágrimas olhei o "mas por que beijou?" , eu estava confusa não sabia se foi ali que o sentimento apareceu ou se ele já existia e tinha apenas acabado de germinar a sementinha da paixão. Minha vontade era apenas de abraça lo como nunca antes, agora sem nunca mais soltar. A ausência de contexto logo transformou nosso relacionamento lindo em brigas e feridas que ainda estão abertas. Ninguém o conhece mais que eu, nem mesmo a mãe dele e igualmente ninguém conhece me mais que ele. Esse saber excessivo que levou a tantas brigas. O meu mau gênio e a mania de querer saber demais, minhas linhas tortas não andavam em paralelo com as linhas dele. Agora nossas vidas não estavam sendo apenas vidas cruzadas. O espírito aventureiro dele e o meu medroso jeito de me arriscar sempre com os dois pés atrás fez um emaranhado de linhas. Em meio a tantas brigas e momentos de infinitos amores eu buscava o fio da meada para desenrolar aquela situação muitas vezes agradável embora desgastante. 
Não encontrei o fio da meada mas descobri que a meada pode ser cortada. A tesoura que encontrei foi o tempo. Terminei com aquilo mas ainda sou refém dos sentimentos. Ele ainda me considera sua confidente e eu não confidencio a ele que o amo apesar dos pesares. Não há como saber se ele realmente superou, afinal ele sempre foi um bom mentiroso. Foi com ele que eu aprendi. As lembranças me levam a pensar que foi ali entre as linhas do pôr do sol, entre as linhas do calçadão,  entre as fibras do coco no refresco da água em minha boca seca sem palavras, entre o limiar dos olhares que nossas vidas se emaranharam. Entre as linhas ou na ausência delas. Porque paixão é isso mesmo, é uma bagunça de fios sem contexto em que às vezes o melhor a fazer é cortar mesmo quando a tesoura deixa uma parte do outro na gente. A parte que a nós não cabe mas às vezes pertence. Uma ausência com presença que se coloca no lugar como a planta dentro da semente. Sabendo que ela não cabe mas ali mas só por existir é seu dever fingir ausência. 
3 de julho de 2014

Apenas metáforas


Eu não sabia que era capaz de perdoá-lo. Depois de tudo que ele fez, a farsa, as mentiras e mesmo sem ter admitido o próprio erro ou ter me pedido desculpas eu desculpei-o. O que sinto agora é uma imensa vontade de descobri-lo. Eu poderia simplesmente ir até ele e pedir uma explicação que eu sei que ele nunca dará. Mas não posso, não é orgulho é só proteção. Ele nunca foi sincero comigo ou pelo menos em grande parte não foi. Não é certo eu correr atrás de um mentiroso que pode destruir ainda mais meus sentimentos. Meu desejo é que ele viesse até mim pedindo perdão e dizendo que sente muito e que sente algo por mim. Eu duvidaria, mesmo que uma dúvida fingida mas sentiria uma... Não sei o que sentiria, nunca fui a pessoa que sente mas sou a pessoa que imagina. Por mais dolorosa que foi essa experiência de ser enganada parte de mim ficava feliz por ele sempre ter estado tão perto, mesmo que eu não saiba quem ele é de verdade. Resta-me agora apenas escrever o que tanto preciso esconder. Mais uma vez ocuparei os esconderijos do meu coração. Aqueles que por tanto tempo deixei de portas fechadas e tornei-me mais transparente inutilizando-os. Agora tais caverninhas do meu ser voltam a estar ocupadas. Na caverna maior habita uma vaca muito sábia, intocável e sagrada, uma flor que nunca murcha e que nasceu entre pedrinhas e espinhos. A flor abriga uma fada de asas douradas que está morrendo. A fada chama-se Esperança. A flor é seu abrigo mas suas pétalas a sufocam por mais macias que sejam. A flor imortal floresce, ela deseja incessantemente ser arrancada dali. Ela quer sair daquela caverna e florescer em meio à luz do sol e ao brilho do luar. A vaca a vigia e não deixa que nenhuma criaturinha da noite a colha e leve-a para fora da caverna. A esperança padece e o vento frio adentra a caverna gelando meu peito. Mas são apenas analogias que faço para desgrenhar os fios das meadas em meados do meu ser. Apenas analogias.

Vocabulário metafórico: vaca=razão, fada=esperança, flor=sentimentos e emoções.
1 de julho de 2014

Calma sem carma



Sinto carma, me sinto um carma, meu próprio carma sou eu, é tão difícil conviver comigo mesma e depois deixar tudo para trás agir como se eu não sentisse nada, como se eu não fosse nada (não sou nada mesmo). É pior conviver com seu carma quando ele já se tornou você, ou ainda pior, grande o bastante e capaz de se fundir ao seu próprio ser. Todos nós temos um carma mas a maioria das pessoas consegue pelo menos dormir sem ele ou não pensar nele. Talvez uns dirão que pareço atriz, que sou a rainha do drama e etc… Não queria que ninguém visse o que eu escrevo sem pensar mas que fique claro: ninguém é forte o tempo todo, e uma hora tudo escapa, você escapa de si se descontrola, joga toda a reputação que criou para o ar como se esta nunca houvesse existido. Deixo rastros o tempo todo sobre o que realmente sou, mas parece que é tão fácil encobri-los que quando realmente percebem como eu sou e me sinto me desespero. Não recupero tão rapidamente a essência das alegrias constantes.  Sinto falta, faz me falta ser somente eu sem me culpar por ser eu. Conformar me com a minha essência de ser ou muda la. Sem carma, com calma, depois dos desabafos e das lágrimas o jeito é prosseguir, esquecer como me sinto quando estou sozinha e quando penso demais. O jeito é seguir em frente dando trancos e passando por barrancos e vez ou outra construindo uma ponte de amizade que me faça conseguir chegar ao outro lado do rio. Porque a vida é isso mesmo, um dia a gente sente no outro a gente só é feliz. Feliz por inteiro,sem carma. Calma !